Federalizar é a única saída
Empresários, político e economista avaliam que venda das ações para Eletrobrás é única solução para que a empresa volte a oferecer serviço de qualidade
ANDRÉIA BAHIA
Para o economista Eber Vaz, a proposta deve ser avaliada sobre dois pontos de vista: econômico e político. Economicamente, analisa o economista, a proposta é viável porque o recurso que vai entrar na Celg, R$ 3,43 bilhões a título de empréstimo e os R$ 1,35 bilhão que o governo vai pagar à empresa com recursos oriundos do BNDES, é quase que suficiente para pagar a dívida de R$ 5,7 bilhões da Celg. “Resolve o problema da empresa, pelo menos por enquanto. Não sei se no futuro a Celg vai ter condições de pagar o empréstimo de R$ 3,43 bilhões”, analisa. Mas de todo jeito, a dívida da empresa será bem menor porque os juros a serem cobrados pela Eletrobrás são inferiores ao que a Celg vem pagando. “A Celg está trocando de passivo, passando para um mais barato.”
Pesa na proposta o fato de o Estado perder a gestão da Celg, observa Eber Vaz. “Se a Eletrobrás ficar com as quatro diretorias e a vice-presidência, o presidente indicado pelo Estado será figurativo.” Mas na opinião do economista, o que dificulta mais a negociação nos termos propostos pela Eletrobrás é o aspecto político. “Vamos ver se o governador tem mesmo interesse em resolver o problema da Celg porque politicamente ele pode perder muito.” Caso a Eletrobrás assuma a gestão da Celg, é possível que haja uma reestruturação na empresa, o que significa desemprego e críticas. “A situação pode se voltar contra o governador. Se ele estivesse em final de mandato, não haveria tempo para Alcides Rodrigues absorver o desgaste, mas nesse momento político, é arriscado.”
No entanto, o economista observa que o Estado não tem alternativa. “Não há outra solução. Pode ser que o governo consiga que a Eletrobrás melhore a proposta, faça um compartilhamento de gestão mais equilibrado, aumente o valor oferecido pelas ações.” Na opinião de Eber Vaz, mesmo do jeito que está, a negociação é boa para o Estado. “Pode não ser interessante para o governo. Se Alcides Rodrigues não aceitar, ele não vai estar pensando no Estado, mas nas eleições.”
A crise da Celg, que pode ser resolvida a partir da negociação com a Eletrobrás, não é apenas financeira. Há por trás desde endividamento e o aspecto operacional da empresa, que já não consegue fazer investimentos em suas linhas de transmissão. O sucateamento da Celg reflete no serviço que ela presta e as constantes quedas de energia são reflexos da crise que a empresa atravessa. “A Celg do jeito que está compromete a capacidade de crescimento do Estado”, afirma o economista. E ele não está falando de futuro.
Apagões — A Celg já não consegue fornecer energia de qualidade para seus clientes. Os apagões têm sido constantes em todo Estado, trazendo prejuízos para todo mundo, mas principalmente para as granjas, laticínios e indústrias, que dependem da energia elétrica para produzir. É o caso da IBG — Indústria Brasileira de Gases, que se instalou em Aparecida de Goiânia há cerca de dois anos e nunca conseguiu operar por causa das frequentes interrupções de energia.
Logo que começou a funcionar, em junho de 2008, a indústria foi obrigada a parar a produção para substituir todos os equipamentos da fábrica, que haviam sido danificados por causa das oscilações na energia elétrica. Segundo o presidente da empresa, Newton de Oliveira, o prejuízo mensal da empresa é de R$ 100 mil. “A Celg é considerada uma das piores empresas de energia elétrica do País. Eles mandam energia com qualidade ruim e, como a fábrica tem componentes muito sensíveis, a variação da energia queima os motores da fábrica.” Segundo o presidente, os componentes da fábrica são importados “e, a cada hora, queima um elemento diferente”.
Além disso, a IBG é obrigada a pagar bem mais caro pela energia que a Celg lhe fornece. Segundo ele, o quilowatt de energia custa algo em torno de 35 centavos, e a IBG paga 7 reais. Segundo Newton de Oliveira, a indústria assinou um contrato de demanda com a Celg e mesmo consumindo uma quantidade muito menor de energia porque a fábrica não tem condições de funcionar com a energia fornecida pela Celg, a IBG é obrigada a pagar o valor total do contrato. “Somos cobrados como se o fornecimento ocorresse em condições normais”, reclama o presidente.
A indústria está parada porque nunca conseguiu funcionar três dias sem ter um corte de energia, “o que traz um desgaste muito grande e prematuro nos equipamentos e prejuízos porque queima os elementos”. O empresário, que já entrou na Justiça contra a Celg, pensa em fechar a unidade de Aparecida de Goiânia. “Enquanto não tivermos uma posição oficial, não podemos dar continuidade à produção.” No fim do ano passado, a IBG propôs uma primeira ação contra a estatal por causa da baixa qualidade da energia fornecida à empresa. O juiz concedeu uma liminar obrigando a Celg a fornecer energia de qualidade à IBG e impôs a estatal uma multa de R$ 5 mil para cada queda de energia que ocorresse. A Celg recorreu da decisão, mas a penalidade foi mantida. A Justiça determinou também que seja feita uma perícia técnica por um engenheiro elétrico para se verificar o que de fato está acontecendo.
A indústria entrou com uma segunda ação requerendo que o pagamento da conta de energia fosse feita por meio de depósito em juízo, tendo em vista que a Celg vem cobrando o valor total do contrato de demanda apesar de a empresa não estar consumindo energia. “Não acho justo pagar o valor que é cobrado, R$ 75 mil, por um consumo muito menor porque não conseguimos fazer a fábrica funcionar”, afirma o empresário.
Desde o mês passado, a indústria vem depositando o pagamento em juízo, mesmo assim, recebeu uma notificação de corte de energia por falta de pagamento. “O que é um absurdo e demonstra a falta de controle deles”, observa Newton de Oliveira.
Além disso, o empresário pretende entrar com ação indenizatória no valor de R$ 5 milhões, montante investido na instalação da fábrica em Aparecida de Goiânia, por conta de perdas e danos. “Fomos apelidados de vaga-lume porque a energia cai toda hora”, conta o empresário. Ele calcula que desde a instalação, a indústria somou um prejuízo estimado R$ 5 milhões com o desgaste de equipamento e lucros que a empresa deixou de aferir porque não consegue funcionar plenamente. “Na Celg, o que se ouve é que em fevereiro será resolvido, mas não diz de que ano.” O empresário já reclamação na Aneel e na Agência Goiana de Regulação (AGR) e, segundo ele, muitas empresas instaladas em Aparecida de Goiânia têm o mesmo problema com energia. “A Celg está quebrada e é mal gerida”, diz o empresário.
A indústria de biscoitos Mabel é uma das empresas que sofre com a baixa qualidade da energia. Segundo o empresário e deputado federal Sandro Mabel (PR), a empresa também entrou na Justiça cobrando indenização da Celg por causa dos prejuízos provocados pelas constantes quedas de energia. “O sistema da Celg é instável e a retomada de uma fábrica pode demorar até quatro horas. Já aconteceu da energia cair quatro, cinco vezes em um único dia”, conta.
Sugando o governo — Sandro Mabel é político, mas a avaliação que faz da situação da Celg é empresarial. Ele afirma que a estatal está inviabilizando o crescimento de Goiás. “Em Caldas Novas, já não se pode construir mais nenhum hotel porque não há energia; em Cristalina não se pode instalar mais pivô para irrigação pelo mesmo motivo e essa situação se repete em todo Estado.” Além disso, observa o deputado, a Celg está “sugando o governo, que precisa aplicar na empresa dinheiro que poderia ser gasto em outra coisa”. Na opinião de Sandro Mabel, a federalização é a melhor solução para a empresa, que vai passar a ter uma gestão mais profissional e funcionar de forma mais eficiente. “Para que ter uma empresa de energia que não presta um serviço de qualidade, não tem tarifa barata e não recolhe ICMS”, questiona. Ele lembra que no caso do ICMS, a inadimplência da Celg tem desdobramentos até nos municípios, que deixam de recebem a parte do imposto que a Celg deveria recolher para o Estado. “Da maneira que está, a Celg está inviabilizando o Estado”, afirma Mabel.
O deputado estadual Mauro Rubem (PT) também é favorável à federalização da estatal, que segundo ele, vai continuar sendo pública. “Nós temos dois caminhos: privatizar, aí a Celg vai para as mãos da iniciativa privada e isso é muito ruim, ou federalizar.” A segunda alternativa é ainda melhor, na opinião de Mauro Rubem, porque obriga o governo federal a tirar a Celg da crise e fazer a empresa cumprir efetivamente seu papel. “A melhor solução é esta e se o Estado tiver prejuízo, será resultado da má gestão que fez na Celg.” Além disso, observa o deputado, não adianta a Celg valer mais que o que está sendo oferecido pelo Eletrobrás se o mercado não compra.
Na opinião do deputado petista, o governo do Estado está demorando para aceitar a proposta da Eletrobrás, que cria condições para que a Celg saia da crise. “Além de tirar da crise, evita que essa situação de desequilíbrio volte a acontecer.”
A reportagem do Jornal Opção solicitou uma entrevista com o presidente da Celg sobre a negociação entre a empresa e a Eletrobrás, mas, até o fechamento da edição, a assessoria de imprensa da Celg não havia agendado a entrevista.
RETIRADO DO JORNAL OPÇÃO
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